Entrevista ao OJOGO pelo José Manuel Ribeiro e Jorge Maia:
1 - "As minhas ideias são diferentes"
O novo campeão nacional começou a época com um treinador sem títulos mas de espírito aberto, apóstolo da necessidade de ter uma relação cristalina com a Imprensa para que os adeptos estivessem conveniente e saudavelmente informados, e acabou com outro, já com títulos e convencido de que em Portugal a abertura não funciona. Felizmente, o holandês fez regressar por um bocadinho o antigo para uma entrevista cheia de explicações, notícias e, por que não?, ensinamentos. Compreensivo para com Scolari, paternal para Quaresma, implacável para Ricardo Costa - não sai! - e elogioso para muitos. O FC Porto, Paulo Assunção, Co Adriaanse...
Podíamos escrever que falta a esta entrevista uma pergunta e que foi de propósito, mas a verdade é que falta uma pergunta e não foi de propósito. Cinco meses silenciosos e silenciados deixam um lastro demasiado grande para a curta hora e meia que Co Adriaanse aceitou destinar à primeira grande entrevista a um jornal português: em suma, não lhe perguntámos até que ponto ficou feliz e contente com os primeiros títulos da carreira. A consolação é que outras partes terão forçosamente escapado a esta verdadeira autópsia de uma época e a metáfora não está exagerada, porque o holandês gosta de ir ao detalhe quase científico para explicar as suas ideias. Que são diferentes, que o FC Porto já conhecia muito bem quando o contratou e que, se mudanças sofreram durante o tormentoso percurso, foi sempre para dar um passo em frente e nunca, mas nunca, atrás. Se alguma certeza sai deste trabalho é que Adriaanse não recua, aliás, recua ainda menos do que admite, porque, para quem decidiu fechar-se à Imprensa, as próximas páginas não poderiam conter mais informação, revelações e até velhas histórias finalmente decifradas, como as de Jorge Costa, Postiga, Diego, do avançado holandês que o FC Porto quis roubar ao Ajax e os segredos de Quaresma. Fica alguma coisa por escavar na troca de Baía por Helton. Ah, e foi tudo em inglês.
O JOGO | O livro mais conhecido a seu respeito tem um título estranho: "Eu nunca cometo erros"...
R| ...não fui eu que disse isso.
P | A pergunta é: cometeu erros esta temporada?
R | Claro. Tive de tomar duas mil decisões e ninguém consegue tomar duas mil decisões acertadas. Portanto, também tomei más decisões, mas isso é normal. De resto, não consigo lembrar-me de exemplos concretos.
P | Qual é a explicação para o título do livro?
R | Saiu de uma conferência de Imprensa antes da meia-final da Taça UEFA, no AZ Alkmaar. O AZ é um clube muito pequeno e ter chegado lá foi um milagre. De repente, um jornalista perguntou: cometeu erros esta temporada? Erros? Estávamos na meia-final da Taça UEFA e em segundo lugar no campeonato holandês; durante 23 anos o AZ não conseguiu jogar nas competições europeias. Como podiam estar a falar de erros, a colocar aquela pergunta? Se o AZ fosse o segundo a contar do fim, então faria sentido. E, nesse contexto, respondi que achava não ter cometido erros porque estávamos na meia-final da Taça UEFA e estávamos melhor do que Ajax e Feyenoord, na Holanda. Tiraram isso de contexto e disseram que eu não cometo erros. Claro que cometo erros, talvez cometa menos erros que alguns dos outros treinadores.
P | Diria que cometeu menos erros do que os outros?
R | Diria que cometi erros, mas que nos podemos dar por satisfeitos. Prometi ao clube o campeonato e a Taça; prometi fazer muitos golos e prometi um bom comportamento na Liga dos Campeões. Dessas promessas, só a última não foi cumprida, mas quando se ganha o campeonato e a Taça, podemos dar-nos por satisfeitos. Não tenho dúvidas de que foram mais as decisões acertadas que tomei do que os erros que cometi.
P | Que palavra descreveria melhor a sua relação com os jogadores esta temporada: investigação ou educação?
R | Investigação. Quando cheguei, só conhecia os jogadores por DVD. E isso é completamente diferente de os conhecer pessoalmente, durante os treinos e durante os jogos. Só depois disso é que se consegue saber o verdadeiro potencial dos jogadores. Tive que investir muito tempo nos jogadores mas também na estrutura do clube, no sentido de conhecer melhor o presidente, o departamento médico, todo o staff. Conhecia o Rui Barros como jogador, mas não como pessoa e não como técnico e tive que investir algum tempo nele. Não conhecia grande coisa sobre o futebol português, sobre as ideias dos outros treinadores, sobre os estádios ou até sobre a qualidade dos relvados, e sobre os jornais desportivos diários, que não existem na Holanda. Lá só temos uma revista por semana. É muita coisa diferente e tive de investir muito tempo na investigação de todos esses aspectos para aprender mais e mais sobre o futebol português. A própria língua.
P | Isso serve de explicação para o facto de jogadores tão importantes como Pepe e Paulo Assunção não terem sido titulares no início da temporada?
R | Eles também não jogavam na anterior. O Pepe não estava na equipa titular e o Paulo Assunção estava na Grécia. Tive de fazer uma equipa e isso não se consegue numa semana.
P | Mas estão diferentes agora? Foram eles que mudaram?
R | Acho que qualquer jogador só se pode desenvolver se jogar. Se não jogar, ninguém o pode ver e analisar a sua evolução. O Pepe e o Paulo Assunção fizeram muitos jogos e as pessoas viram o que faziam, tal como aconteceu com o Quaresma ou o Lucho. Mas o Diego, por exemplo, não jogou tantas vezes e não teve oportunidade de se desenvolver. Só eu é que o via nos treinos e as pessoas não percebiam as minhas opções. O Ibson também é bom jogador, mas não pôde jogar muito porque tenho o Lucho para aquela posição.
P | Curiosamente, deu ao Ibson a camisola 6, um número que o colocava num lugar diferente, de acordo com o seu próprio método...
R | No início, o clube pediu-me para dar números aos jogadores. Isso aconteceu na terceira ou quarta semana de trabalho. O Ibson estava a jogar como médio direito e eu disse que, sim senhor, ele era muito bom jogador e podia ficar com a camisola 6. Na altura, não o conhecia muito bem, nem ao Lucho, nem à maior parte dos outros e tive de perceber quais eram as capacidades de cada um para depois poder construir uma equipa de acordo com as minha ideias. E as minhas ideias são diferentes das dos outros treinadores. O FC Porto conhecia-me muito bem quando me pediu para vir para cá. Conhecia a minha personalidade, a minha filosofia de treino, a minha visão sobre o futebol. Sabiam bem quem eu era e precisavam de alguém que fosse capaz de tomar decisões. Havia muitos jogadores, cerca de 32 ou 33, e era preciso fazer escolhas. Era preciso escolher uma equipa, uma equipa que ganhasse e da qual os adeptos gostassem. Foi isso que tentei fazer.
2- "Falámos em sair depois do ataque de que fui alvo"
P | Pensou em voltar à Holanda depois do incidente com o seu carro no Olival?
R | Ficámos muito preocupados, eu e os meus colegas. Wil Coort estava ao meu lado no carro quando tudo aconteceu. Estávamos em primeiro lugar no campeonato, tínhamos acabado de chegar de Vila do Conde, onde empatámos 0-0, comigo na bancada, depois de uma decisão incrível no jogo da Taça. Sou um treinador correcto no banco porque acho que o nosso trabalho é feito durante a semana e os jogadores sabem o que devem fazer durante os jogos. Só me levanto quando sinto a necessidade de mudar alguma coisa na equipa e sou sempre muito correcto, portanto, não percebi aquela decisão de me suspenderem. Aquele incidente fez-nos pensar. Se as pessoas são tão agressivas, o que estamos aqui a fazer? Sou um homem correcto, estou a trabalhar duro, tenho uma intenção positiva, estou a fazer bem o meu trabalho, então porquê tanta agressividade? Falámos na hipótese de sair, mas o presidente e o Antero Henrique falaram connosco, disseram que estavam do nosso lado, que nos apoiavam, que nos queriam aqui e sublinharam que se tratava apenas de um pequeno grupo de pessoas. Aliás, os portugueses são muito gentis, mas em todas as sociedades há pessoas loucas. Decidimos ficar e mostrar carácter perante os jogadores, deixando claro que não nos afugentavam com aquilo que não passa de um comportamento criminoso
3 - "Se mudei, foi para me aproximar ainda mais da minha filosofia"
P | Foi complicado trabalhar com um grupo de jogadores que não tinham sido escolhidos por si?
R | Não, isso é normal. Sabia, quando vim, quais eram os jogadores de que o FC Porto dispunha e com quem iria trabalhar. Eu sou o profissional e a minha missão era escolher, decidir e fazer encaixar todas as partes. Para mim, isso nunca foi um problema. O FC Porto ganhou muitos títulos antes de eu cá chegar e é um clube que conhece muito bem o mercado e que compra excelentes jogadores. Só se pode ganhar um campeonato com bons jogadores e foi isso que eles me deram: excelentes jogadores. Sem eles nunca teria construído uma equipa vencedora.
P | Mudou, pelo menos, algumas das suas concepções ao longo da temporada?
R | Não, de todo. Foi exactamente o contrário. Ao longo da temporada fui conseguindo implementar mais e mais os meus conceitos e as minhas ideias, porque leva muito tempo a ensinar os jogadores e a treinar determinados conceitos.
P | Visto do lado de cá, ficou a ideia de que tinha mudado...
R | Talvez, mas apenas para me aproximar cada vez mais da minha filosofia. A equipa mudou radicalmente depois do Estrela da Amadora. Achei que esse era o momento certo para dizer 'acabou' e para tornar a equipa absolutamente fiel aos meus conceitos e à minha filosofia de jogo.
P | No início da temporada, o FC Porto jogava um futebol muito ofensivo e criativo. Actualmente, parece ser uma equipa mais contida, mais calculista. O que aconteceu?
R | Fazer uma equipa é um processo demorado. Mais ainda para jogar no sistema que nós utilizamos. Jogar como nós fazemos é muito, muito difícil. É fácil jogar na contenção, com toda a gente a recuar quando perde a bola, reduzindo os espaços para defender. Quase todos os treinadores em Portugal jogam dessa forma. É muito, muito fácil. E quando se consegue a bola, chuta-se para a frente e espera-se que um golpe de sorte resolva o jogo. É muito fácil. Pôr a equipa a jogar como o FC Porto faz agora, é muito difícil e leva tempo.
4- Mudei o sistema para atacar mais, eficácia na defesa foi coincidência
P | Como chegou ao actual onze do FC Porto?
R | É como ter um "puzzle". Fui tentando várias combinações, trocando impressões com os meus assistentes até chegar a uma equipa com uma filosofia de jogo. De tal maneira que, se um sair, entra outro para o seu lugar, mas a equipa continua na mesma. Dei um bom exemplo disso contra o Boavista, no último jogo. Usei um onze completamente novo, mas o sistema e a forma de jogar foram os mesmos. Aliás, essa equipa que defrontou o Boavista jogou muito, muito bem, especialmente na primeira parte, talvez até tenha jogado melhor do que a equipa titular. Era um jogo complicado, um dérbi da cidade que o Boavista precisava de ganhar, mas eles estavam frescos e motivados, até por terem reagido bem à pressão de dizerem que se tratava da segunda equipa do FC Porto. Queria muito ganhar esse jogo, quer por tudo o que se disse antes, quer pelos próprios jogadores, que são muito bons e que mereciam jogar mais vezes.
P | Bosingwa foi o primeiro trinco do novo sistema e Paulo Assunção ficou no banco. Porquê?
R | A posição ocupada pelo Paulo Assunção é a mais difícil. Acho que o Bosingwa tem condições para a fazer, talvez até mais do que o próprio Paulo Assunção. O Bosingwa é muito rápido e o Paulo nem por isso, o que o obriga a fazer alguns "tackles" para travar os adversários. No entanto, o Paulo é um jogador muito inteligente e estável, capaz de pensar sempre na equipa. Contudo, em termos de características, o Bosingwa pode ser melhor para aquela posição, porque temos sempre muito espaço atrás dos defesas e precisamos de jogadores rápidos. Mas para ele ser útil ali tem de crescer como jogador, para ser mais estável.
P | Não será um problema na próxima Liga dos Campeões ter jogadores mais baixos, como é o caso do Paulo Assunção?
R | Sim, um jogador mais alto poderia ser uma vantagem. Mas se o Paulo fosse dez centímetros mais alto e se fosse mais rápido, estaria a jogar no Arsenal ou no Chelsea ou no Milan ou na Juventus. Tenho muita sorte que ele seja um pouco mais baixo e que esteja por cá. É um grande profissional e um trabalhador incansável nos treinos, tal como é nos jogos.
P | O sistema mudou depois do jogo com o Estrela para que a equipa atacassse melhor ou defendesse melhor?
R | Para atacar melhor.
P | Pois, mas em vez de marcar mais golos, passou a sofrer menos...
R | Sim, mas isso não teve a ver com o sistema, antes com a eficácia dos jogadores. Nós criamos muitas oportunidades, mas temos dificuldades para as concretizar. Eu crio as condições para os jogadores estarem no ataque. A bola está sempre no ataque e nós temos cinco ou seis boas oportunidades todos os jogos. Devíamos conseguir uma média de, pelo menos, dois golos por jogo.
P | Nesse caso, os resultados conseguidos pela defesa são uma coincidência?
R | Sim. Mudei o sistema porque não estávamos a marcar golos suficientes e porque não estávamos a pressionar o suficiente os adversário. Quando pressionamos os adversários, é mais provável que comentam erros e que nos proporcionem mais oportunidades. E o facto é que tivemos muitas oportunidades mas não conseguimos concretizá-las. Contudo, como pressionamos logo no ataque, é muito difícil para as equipas chegarem à nossa baliza, há uma enorme distância a percorrerem. Essa é a razão para sofrermos tão poucos golos. Muitas vezes, o Vítor Baía e o Helton acabavam os jogos com uma ou duas defesas.
P | De certa forma, encontrou sem querer o ovo de Colombo...
R | Sim, mas não era de uma solução para defender melhor que andava à procura. Era uma solução para atacar. Funcionou, tirando o desperdício de lances. Há um exemplo disso com o Setúbal, na final da Taça. Estava 1-0 e um golpe de sorte do Setúbal podia ter mudado tudo. Estava preocupado. Podíamos ter marcado quatro ou cinco vezes, mas sofremos até ao fim e isso é um pouco a imagem do FC Porto deste ano: atacámos muito mas marcámos pouco. McCarthy podia ter marcado pelo menos 15 golos esta temporada e não foi além de três. Em compensação, o Lucho marcou dez, apesar de ser médio.
P | Adriano foi importante para dar eficácia ao ataque?
R | O Adriano conseguiu uma excelente média de golos por jogo e foi muito importante nesta segunda fase do campeonato. Foi uma excelente escolha do presidente.
P | Já o conhecia?
R | Não, não o conhecia. Foi uma prenda do presidente. Falei com o Rui Barros, que é muito importante para nós, porque conhece muito bem os jogadores. Ele disse-me que o podíamos usar e tinha razão. Não precisei de mais do que cinco minutos de treino para perceber que se tratava de um bom jogador. Falei com ele antes e percebi na sua atitude, na sua entrega, que era um jogador que podia usar de imediato. De resto, ele não é importante apenas dentro do campo, mas também para criar um bom ambiente e espírito de equipa.
5 - "Se tivesse dinheiro comprava um avançado que garantisse golos"
"Tentámos comprar o Huntelaar, mas ele não quis emigrar. Foi uma atitude inteligente da parte dele. É muito novo e quer afirmar-se no Ajax e na selecção holandesa antes de pensar em sair"
P | Carlos Queiroz acha que Co Adriaanse só podia ter sido campeão no FC Porto ou no Manchester, por considerar que clubes menos sensatos tê-lo-iam despedido durante a fase mais complicada da temporada. Concorda?
R | Não me parece. Cheguei aqui com o clube numa situação complicada. Tinham despedido três treinadores num só ano, os adeptos estavam descontentes e os resultados não existiam. Quando se começa assim, tão mal, leva algum tempo a construir uma equipa capaz de jogar bem. E nós nem sequer jogávamos mal no início. Jogávamos bom futebol, mas não tínhamos sorte. Podíamos ter ganho ao Glasgow Rangers, podíamos ter ganho ao Artmedia e podíamos ter empatado em Glasgow. Por que deveria a Direcção despedir um treinador que estava a fazer um bom trabalho? Acho que outras administrações teriam percebido o mesmo e teriam tomado a mesma posição, mantendo a confiança.
P | Já usou o seu sistema na Europa com êxito, contra o Villarreal, por exemplo. Significa que ele é utilizável na Liga dos Campeões?
R | O sistema não é importante. Depende do jogo. A minha equipa sabe como jogar de várias formas, 4x3x3, 3x3x4, 3x4x3. Somos muito flexíveis.
P | A propósito ainda da Liga dos Campeões, acha que o FC Porto era uma equipa menos pragmática nessa altura da temporada?
R | Fomos infelizes nesses jogos, mas acho que a equipa é muito mais madura agora. Isso aconteceu em Setembro e Outubro. Passou quase um ano. Estamos bem melhor agora.
P | No jogo de Glasgow e depois no de Milão mostrou-se preocupado com a altura dos jogadores da defesa do FC Porto. Acha que há aí um problema potencial também para a próxima temporada?
R | No futebol internacional, o tamanho, a velocidade e a força são muito importantes. Se conseguirmos controlar o jogo, pode não ser um problema. A equipa do Barcelona também não é muito alta e joga muito bom futebol.
P | Mas o Barcelona tem jogadores altos em posições-chave...
R | O Barcelona tem excelentes jogadores em todas as posições, porque os pode comprar. Nós não o podemos fazer. É como ter um jardim. O FC Porto tem de plantar aquilo de que precisa e esperar que cresça. Enquanto isso, Chelsea ou Barcelona vêem o que nós plantámos e compram já crescido. E nós voltamos a ter de plantar. Essa é a grande diferença, mas comprar uma equipa também é complicado. Quando se faz tudo desde o início, pode planear-se a estrutura e conseguir uma equipa tão forte como as dos outros. Mas, para isso, é muito importante poder manter todos os meus jogadores. O Pepe não pode sair, o Paulo Assunção não pode sair, o Helton não pode sair, o Lucho não pode sair, o Quaresma não pode sair e o Adriano tem de ficar.
P | Tem medo de que esse êxodo aconteça?
R | Sim, tenho. Se fosse o treinador de um clube com muito dinheiro compraria dois ou três jogadores, assim tenho que esperar que estes não saiam. Tenho medo, mas espero que ninguém consiga percebê-lo.
P | Se tivesse esse dinheiro, de que jogadores precisaria?
R | Precisaria de um avançado que me conseguisse garantir golos...
P | Huntelaar, que era do Herenveen e agora joga no Ajax, por exemplo?
R | Tentámos comprar o Huntelaar, mas ele não quis emigrar. Foi uma atitude inteligente da parte dele. É muito novo e quer afirmar-se no Ajax e na selecção holandesa antes de pensar em sair para o futebol inglês ou alemão. Mas um avançado que garanta golos é a posição mais importante de qualquer equipa.
P | Há outras prioridades para além do ponta-de-lança?
R | Extremos que sejam muito eficazes nos cruzamentos.
P | Como o Diogo Valente?
R | Sim, ele é muito bom nesse último passe. Nós temos alguns bons extremos. Alan, por exemplo, pode jogar no lado direito e no lado esquerdo, é um excelente jogador de equipa, mas tem alguns problemas no último passe.
P | E da formação, não há jogadores que possam transitar para a equipa principal?
R | Gosto do Hélder Barbosa. Pode jogar no lado esquerdo e no meio-campo. O Anderson é mais médio do que extremo. Disseram-me que era um extremo capaz de jogar nos dois lados, mas eu acho que ele é um típico número dez ou um médio esquerdo. Gostei muito de o ver jogar com o Boavista no meio-campo.
P | Aquela foi a primeira vez em que ele teve de defender em toda a carreira, não foi?
R | Não, de todo. Ele disse-me que jogou muitas vezes como lateral-esquerdo no Brasil. Também não sabia, mas a verdade é que durante os treinos o usámos como lateral e ele saiu-se bem, porque é muito forte e está sempre concentrado. Acho que a melhor posição para ele é a dez ou como médio esquerdo, porque também sabe defender.
6- "Espero muito do Anderson"
P | Porque razão experimentou Anderson e depois esteve tanto tempo sem o utilizar?
R | Porque vi que ele não estava pronto para a nossa equipa.
P | Não foi porque tivesse medo de que a Imprensa o estragasse?
R | Não. Só tinha dezassete anos. Chegou sozinho do Brasil, a um ambiente novo e pensava que era o melhor do Mundo, porque todos os dias lia isso n'O JOGO. Houve muita publicidade durante meio ano. Eu próprio pensei que não voltaríamos a perder, porque vinha aí o Anderson, que é tão bom jogador.
P | E não é?
R | Ainda não.
P | Vai ser?
R | Sim. Espero muito do Anderson na próxima época, porque nessa altura estará habituado ao país, aos colegas, à nossa forma de jogar, etc, etc. É um jogador multifuncional. Podemos usá-lo como ponta-de-lança, como lateral-esquerdo, mas a melhor posição é no meio-campo, pela esquerda.
7- "Quaresma estará na selecção no prazo de um ou dois anos"
P | Aquelas primeiras notícias sobre a sua preocupação com a disciplina incomodaram-no tanto como pareceu?
R | Sim, porque não era verdade. Ninguém me conhecia em Portugal e, de repente, toda a gente me chamava general e dizia que eu não deixava ninguém fazer nada. Mas, se perguntassem aos jogadores, eles teriam dito que não, que era tudo normal.
P | Mas começou por ser o presidente do FC Porto a descrevê-lo como um disciplinador...
R | Não sabia. Acho que é errado pensar-se em mim como um disciplinador. Co Adriaanse é um treinador de futebol. Se perguntarem na Holanda, os jogadores dirão que o Co Adriaanse gosta de disciplina mas é honesto e tem um comportamento normal, nunca faz nada que fuja à normalidade. É como numa família. Tem-se um pai, uma mãe, uma criança e precisa-se de regras: lava os dentes, lava as mãos, limpa as tuas roupas, tem cuidado, não digas falsidades a respeito de ninguém. Coisas normais. Como pai ou como mãe, somos responsáveis pela nossa criança.
P | Num livro sobre o Ajax de Van Gaal, de que o Co Adriaanse fez parte, percebe-se como o individualismo é combatido e como as tentativas de destaque, a cor das botas, o penteado, o automóvel, são consideradas prejudiciais. Não é o seu pensamento?
R | Também é um processo evolutivo. No futebol actual, os jogadores são estrelas de cinema. Quaresma é uma estrela de cinema. Estão todos os dias nos jornais, na televisão, todas as semanas mudam de penteado, guiam carros caros e aparecem acompanhados por mulheres bonitas. Não se pode combater isso. Eu prefiro jogadores mais normais. O Paulo Assunção não usa brincos, chega sempre a tempo, nunca, nunca se atrasa. Mas também precisamos de Quaresma. As pessoas gostam de espectáculo e ele tem algo de especial nos pés. Um gesto de Quaresma pode dar em golo. Decidiu muitos jogos para nós. Porém, também é preciso ensiná-lo. 'OK, Ricardo, és um jogador especial, gosto de ti, as pessoas gostam de ti, mas não é espectáculo para 90 minutos e se estiver 0-0 tens de jogar para a equipa. Se estiver 3-0, podes dar o teu show. Porta-te bem'. O golo do Jorginho em Alvalade foi o mais importante de toda a época, mas a atitude do Quaresma também podia ter sido decisiva. Se o árbitro lhe tivesse dado vermelho, e devia ter dado, passaríamos a jogar com dez e o Sporting talvez ganhasse e talvez acabasse campeão na nossa vez. Foi preciso dizer ao Ricardo 'não voltes a fazer isso, estás a ganhar-nos o campeonato com as tuas acções, com os teus cruzamentos, mas também podes perdê-lo'. Tem de aprender. Se aprender, será um jogador melhor.
P | Há quatro extremos melhores do que Quaresma nos convocados da selecção portuguesa?
R | Figo e Ronaldo são melhores. Figo tem muita experiência.
P | Há mais dois.
R | Pois, o Boa Morte e o Simão. O Simão é muito experiente e muito bom nos livres. Muito bom. Fez muitos golos para o Benfica. Mas o Quaresma estará na selecção, com toda a certeza, no prazo de um ou dois anos.
P | Ele agora é extremo-direito ou esquerdo?
R | Enquanto extremo-direito, se não pode fugir por fora para cruzar, vai para o interior do campo e perde a bola; se estiver na esquerda e for para dentro, pode protegê-la, porque é dextro, e tem um bom remate dessa posição. Contra o Guimarães, fez um golo assim. É típico dele. Tem ainda outra vantagem: se estiver na esquerda, a driblar, consegue aquele cruzamento muito rápido com o pé direito. Mas fá-lo demasiadas vezes. Aliás, agora, faz sempre com o pé direito. Tenho de dizer-lhe, 'Ricardo, usa também o pé esquerdo', até porque o pé esquerdo dele também é muito bom. O que acontece é que, cruzando com o direito, muitos cruzamentos são demasiado baixos e fáceis de defender. Mas o Ricardo é assim. Tenho de ensinar-lhe quando procurar o interior do relvado, quando usar aquele típico cruzamento de pé direito, quando usar o cruzamento com o pé esquerdo, a melhorar os cantos, os livres...
P | E está a funcionar?
R | Está a funcionar. Acho que o Ricardo é melhor agora do que era há um ano.
P | Tem margem para melhorar ainda mais ?
R | Pode melhorar sim, porque tem muito talento e uma mente aberta. Tenho uma boa relação com ele. É difícil, porque estamos a falar de uma personalidade muito especial, mas o nosso relacionamento é bom.
8- "Scolari tem uma intenção positiva"
P | O sucesso do seu sistema teve alguma coisa que ver com a filosofia defensiva das equipas mais pequenas do campeonato português?
R | Não, é sempre muito difícil ganhar qualquer jogo. É difícil para nós, para o Sporting e para o Benfica porque as equipas estão muito bem organizadas e são tacticamente muito disciplinadas. Na Holanda, até as equipas mais pequenas tentam atacar, mas aqui qualquer treinador fica contente com um empate.
P | Acha que o seu FC Porto pode ajudar a mudar isso?
R | Temos de pensar que vivemos todos à custa do futebol. Estamos todos envolvidos nisto e todos temos a responsabilidade de melhorar o nível do espectáculo para que as pessoas venham aos estádios e para que as crianças torçam pelo FC Porto, pelo Benfica, pelo Sporting ou pelo Braga e para que queiram jogar futebol. Essa é a nossa missão no futebol. Não nos podemos limitar a criticar os árbitros, os outros treinadores ou os outros jogadores. Vamos falar sobre futebol e vamos elevar o nível do futebol. Temos todas as condições para isso. As pessoas em Portugal adoram futebol, são loucas pelo jogo, mais do que na Holanda. Esta história com o senhor Scolari é descabida. Ele tem uma intenção positiva em relação a Portugal. Tem de escolher e não deve ser criticado por ter escolhido este e não aquele. Ele sabe quais são os jogadores com que conta e tem um plano. Então, devemos ter uma atitude positiva e, depois dos jogos, depois dos resultados, aí sim, podemos perguntar porque jogou assim e não de outra maneira.
P | Curiosamente, antes do Europeu, deu uma entrevista sobre o seleccionador Dick Advocaat, dizendo que queria que a Holanda perdesse, porque achava as ideias dele prejudiciais para o futebol holandês...
R | Sim, mas expliquei porquê. A Holanda joga no mesmo estilo das minhas equipas. Por outro lado, Advocaat é um treinador muito defensivo. Quando não se tem jogadores de muita qualidade, como era o caso dele, e a prioridade é defender, pode conseguir-se ganhar um ou outro jogo, mas não se consegue ganhar campeonatos. Para isso é preciso correr riscos e surpreender o adversário. Mas não o critiquei. Não podia era alimentar falsas esperanças nas pessoas em vésperas da competição. Conheço bem o jogo e sabia o que ia acontecer.
9 - "Lucho será melhor na próxima época"
P | Acha que o Lucho esteve a cem por cento esta temporada?
R | Não, mas é natural. Ele não teve férias no último ano e esta época pode ter apenas três semanas, se conseguir chegar à final do Mundial. Se isso acontecer, vai perder as primeiras três semanas de trabalho connosco, mas ele precisa desse descanso. Acho que, se ficar cá, será certamente melhor jogador do que foi esta temporada.
P | Concorda que o Lisandro voltou das férias de Natal em baixa de forma?
R | Sim, mas também foi afectado pelo facto de não jogar. Ele fica muito triste quando não joga e tenho de falar com ele para o motivar, para continuar a treinar. Mas agora também o conheço melhor e sei que ele não é um extremo, é outro número dez. Ele precisa de jogar nas costas de um grande avançado para poder surgir na área a marcar golos, que é algo que ele faz com uma grande facilidade. Não se consegue fazer muitos golos nas alas e é por isso que ele tem de jogar à frente da baliza, perto da área. Mas para essa posição temos muitos jogadores.
P | Muitos jogadores para deixar sair?
R | Alguns sim, porque é melhor para eles e para o clube. É algo que teremos de analisar a fundo.
10 - "Saída de Baía foi a decisão mais difícil"
P | Porque razão escolheu Baía naquele particular com o Tottenham, em Agosto, quando decidiu quem seria o titular na baliza?
R | Tivemos de tomar uma decisão. Naquele momento, juntando tudo, achámos que era a melhor.
P | Porque era o melhor guarda-redes, porque era uma figura importante...?
R | Juntámos todos os aspectos. Muito importante, por exemplo, é que toda a gente conhece o Baía, toda a gente confia nele: os jogadores, os adeptos, a Imprensa. Os próprios adversários têm respeito por ele. Se trazemos algo de novo, estamos a enfraquecer a equipa. O aspecto psicológico é muito importante e a qualidade de ambos é similar. A única diferença é que Helton é mais novo e tem mais anos de carreira pela frente. Estou muito contente por ter dois guarda-redes tão bons. Mais o Bruno Vale, mais o Paulo Ribeiro...
P | Mudou de opinião a respeito do guarda-redes titular porquê?
R | Porque dispus de meia época para observar e porque, naquela altura, achei melhor utilizar o Helton.
P | Teve alguma coisa a ver com o sistema? Com o facto de o Helton ser mais desenrascado com os pés?
R | Não. Nada a ver.
P | Admite que foi um pouco insensível ao fazer a mudança precisamente depois de um mau jogo do Baía?
R | Não tomamos decisões apenas por um jogo. Naquele momento tinha muita informação sobre todos os jogos que ele fizera, todos os treinos...
P | Mas a imagem que transparece não é essa e podia ter sido evitado...
R | Não tiro um jogador porque comete um erro num jogo. A razão não foi essa. Foi a decisão mais difícil, para mim, na época inteira. E expliquei-a ao Baía.
P | Ele reagiu bem?
R | Ficou desapontado, claro, mas a sua reacção foi absolutamente de top. Esteve sempre com a equipa, apoiou sempre o Helton, foi sempre positivo no banco. Agradeci-lhe duas vezes, depois do jogo com o Penafiel, e voltei a fazê-lo na final da Taça. A minha ideia era fazê-lo entrar outra vez, durante a final, mas não foi possível, porque tive de alterar a equipa. Se tivéssemos marcado mais golos e se ainda tivesse substituições para fazer, ter-lhe-ia oferecido os aplausos dos adeptos. Ele merecia-os.
11 - "Não conheço o seleccionador"
P | Alguma vez conversou com Scolari?
R | Nunca o conheci.
P | É um procedimento normal?
R | Se eu fosse o seleccionador, observava todos os jogadores mas também comunicava com o treinador, porque talvez ele pudesse dar-me uma informação que desconhecemos. E é bom para o futebol que o seleccionador ajude os treinadores. Talvez eu pudesse aprender alguma coisa com ele e talvez ele pudesse saber mais alguma coisa a respeito dos jogadores do FC Porto.
P | Está a cometer um erro?
R | Não. É o estilo dele. Se fosse eu, falava com o Paulo Bento, com o novo treinador do Benfica, do Braga... Se estivesse interessado num jogador, perguntava por ele. Talvez devesse também observar treinos, para além dos jogos, porque vê-se muita coisa nos treinos.
12 - "FC Porto é campeão do Mundo da organização"
P | Já elogiou bastantes vezes a organização do FC Porto. A pergunta que lhe fazemos é: o Co Adriaanse trouxe-lhe alguma coisa de novo?
R | Tem de perguntar às pessoas que estão à minha volta.
P | Pode dizer-me se mudou alguma coisa.
R | Nada. O FC Porto é clube muito bem organizado. Condições de top nos treinos, estádio de top, muita gente à minha volta, apoiando-me directamente; muito, muito bom staff médico. Tivemos poucas lesões esta época e quando as houve os jogadores rapidamente estavam de volta, duas vezes mais depressa do que na Holanda. Nesta altura, não temos equipa nem jogadores para ser campeões do Mundo, mas a organização do FC Porto é-o. Para mim, é uma honra trabalhar aqui.
P | Uma das suas imagens de marca é o trabalho com a formação do Ajax, daí que se esperasse algum contributo nessa área, mas não se deu por isso. Estávamos distraídos?
R | Temos falado muito sobre a estrutura do FC Porto, sobretudo sobre o desenvolvimento dos jogadores, mas esta época focámo-nos na primeira equipa. Jan Olde Riekerink tem muita experiência nas escolas do Ajax.
P | Esperava-se que ele tivesse um papel nesse campo, mas não teve...
R | Talvez no futuro. Queremos ajudar o clube. Trabalhámos muitos anos na melhor escola do Mundo, que é a do Ajax, e temos muita experiência. Pode ser que na próxima época seja possível dar uma ajuda.
P | Tirando os minutos que o Hélder Barbosa jogou no Bessa, não usou ninguém das escolas. Porquê?
R | Porque já tenho muitos jogadores.
P | Vieirinha e Paulo Machado?
R | Do Vieirinha ouvi muitas coisas positivas. É um típico extremo-direito, muito rápido, muito criativo...
P | Vai ter uma oportunidade na equipa?
R | Não posso responder nesta altura. Depende dos movimentos no mercado de transferências. Por agora, não fizemos nada, mas às vezes, numa semana ou num dia, as coisas mudam.
13 - "Diego precisa de defender e de aprender a marcar golos"
P | Por que razão Diego não cabe no seu modelo táctico?
R | Diego é um jogador muito, muito bom, mas decidi jogar com dois pontas-de-lança para pressionar mais e desapareceu a posição dez. Quando jogo com número dez, depende do jogo e do tipo de dez necessário, se precisamos ou não que ele ataque e defenda, porque a transição é muito importante. O problema dele é que não marca golos. É mais de entregar a bola do que de procurar a baliza. Lisandro, por exemplo, é um dez que faz golos. Diego é um grande jogador, mas precisa de defender mais, precisa de aumentar o seu raio de acção, de correr maiores distâncias e precisa de aprender a marcar golos. Lembram-se de Litmanen, no Ajax? No princípio, também não marcava, era apenas um jogador de contacto, mas depois começou a marcar golos. Trabalhámos muito com Diego nesse aspecto, mas continua a precisar de melhorar. Talvez jogando no estrangeiro se torne melhor. No futebol alemão, é preciso correr muito. É necessário correr, atacar e fazer muitos quilómetros. No FC Porto, é mais fácil, porque já lá estamos, as distâncias não são assim tão grandes.
P | E Postiga? Como se passa dos elogios do treinador à equipa B?
R | Não foi um problema de qualidade, porque é um jogador de nível internacional e provou-o no Saint-Ettienne. Li que o treinador que saiu, Elie Baup, gostou muito dele. Mas Postiga pensa sempre que dá cem por cento nos treinos. Eu não concordo. Acho que uns dias dá cem, outros oitenta, setenta, sessenta. Tive muitos problemas para o convencer a trabalhar mais, para melhorar o seu nível. É difícil. Talvez seja o único treinador que teve problemas com ele, mas, se um jogador só trabalha uma hora e meia por dia, não pode dar menos de cem por cento. Ontem, visitei uma fábrica em que as mulheres trabalham das oito da manhã às seis da tarde, sem falar, sequer, umas com as outras. Todos os dias o mesmo. Se és um futebolista profissional e só tens de trabalhar uma hora e meia, tem de ser a cem por cento. Não aceito menos. Só se pode melhorar uma equipa ou um jogador dessa forma. Um dia não se está bem disposto, OK, mas isso é uma vez.
P | Nesse caso, o que aconteceu foi que perdeu a esperança?
R | Avisei-o uma, duas, três vezes e afastei-o. Se não, os outros jogadores, que ouviram, teriam legitimidade para pensar, 'se ele não dá cem por cento, por que hei-de eu fazê-lo?', e lá se ia a equipa. Essa é a razão de ter passado aos bês. Não é por ser mau jogador; é um óptimo jogador, mas tem de fazer o seu trabalho e, na minha opinião, não fez. Outros treinadores podem aceitar que ele trabalhe a sessenta ou setenta por cento, desde que marque golos; eu não, porque também trabalho sempre a cem por cento.
P | O problema com Jorge Costa era semelhante?
R | Não. Jorge Costa é cem por cento profissional, muito boa pessoa e um profissional sempre muito positivo. O problema está no sistema. É necessária muita velocidade. Ele pode defender muito, muito bem numa pequena área, com muitos jogadores à volta, mas não num grande espaço. É impossível para ele. Naquela idade, com a mobilidade, as lesões - li que esteve duas ou três vezes lesionado na Bélgica -, não dá. Numa zona pequena, jogando numa equipa defensiva com quatro jogadores e mais dois à frente, ele ainda é um central de top, mas neste sistema não. Constatei-o imediatamente, nas duas ou três primeiras semanas, e disse-lho. Ele quis ficar na mesma e eu autorizei-o a tentar provar-me que podia jogar, mas não o utilizei, porque não mudei de opinião. Tinha tomado a minha decisão e foi uma boa decisão para este sistema. No entanto, respeito o Jorge, porque foi sempre positivo para o grupo e trabalhou a cem por cento até ao último momento. É um verdadeiro profissional e um elemento muito bom para o FC Porto.
P | Sentiu a pressão dos adeptos?
R | Muito. Não fazia ideia de que ele era tão popular. As pessoas diziam-me 'sem o nosso capitão, não ganhamos nada', porque sempre tinham visto o seu clube vencer coisas com o Jorge Costa. Simbolizava o espírito de luta do FC Porto.
P | A decisão foi mais fácil por não saber disso?
R | Era melhor que soubesse. Havia sempre uma senhora de idade no aeroporto que me ameaçava por não usar o Jorge Costa. Agora usa uma camisola do Pedro Emanuel. Tenho de passar a ter cuidado com ele.
14- "Abertura com a Imprensa não funciona em Portugal"
P | O "blackout" foi imposto para proteger Adriaanse da Imprensa ou para proteger o FC Porto de Adriaanse?
R | Serviu para proteger o clube, proteger os jogadores e proteger-me a mim também.
P | É que a Imprensa não estava habituada a ter tantas revelações e notícias nas conferências de um treinador do FC Porto. Por exemplo, foi você quem revelou o ultimato feito ao Nuno Valente...
R | Pois, eu dei-vos a notícia. Na Holanda, temos um espírito muito aberto. Estou habituado a explicar tudo, porque sei que só assim consigo chegar aos adeptos. E eles têm de estar informados. Mas, se as notícias estão a funcionar contra o clube, contra os jogadores ou contra mim, não é bom. Nesse caso, sou castigado por ser aberto. Tive a sensação de que isso estava a suceder, daí a nossa decisão de fazer uma paragem.
P | O clube alguma vez lhe disse que estava a ser demasiado aberto nas conferências de Imprensa?
R | Não, eu tomo as minhas próprias decisões. No princípio, disse-lhes que era aberto e que a Imprensa tinha o direito de saber tudo, para poder explicar aos adeptos, de forma a que eles entendam melhor o FC Porto, os jogadores e a mim próprio, mas a verdade é que isso não funciona em Portugal. O JOGO quer ser melhor do que "A Bola" e "A Bola" quer ser melhor do que o "Record", portanto, também há competição nessa área. Às vezes, fazem notícia de algumas palavras e não é bom para nós. Por isso, passámos a ser mais reservados.
15 - "João Paulo vai fazer a pré-época"
P-Pediu Diogo Valente?
R- Não. Foi uma sugestão do departamento de prospecção e eu vi-o jogar pela Selecção e pelo Boavista. Tem um bom cruzamento, mas não fez muitos jogos pelo clube. Surpreende-me que não tenha feito.
P-É o tipo de extremo que quer?
R-Tem um cruzamento muito bom. Tivemos um exemplo no Portugal-Suíça, de Sub-21, quando ele pôs a bola no Hugo Almeida. Gostei bastante.
P-E João Paulo?
R-Vai fazer a pré-época connosco.Vi-o jogar, claro,mas não o conheço muito bem. Para o posto do Paulo Assunção, não temos muitos jogadores e ele pode jogar nesse lugar. Talvez também na posição do Pepe, mas preciso de ver, porque nenhuma equipa joga no nosso sistema. Só experimentando.
P-Ricardo Costa quer sair. Qual é a resposta que lhe dá?
R-Não quero. É um jogador muito bom. Pode jogar nas posições do Bosingwa, do Pepe, do Pedro Emanuel e talvez possa jogar também na do Paulo Assunção. É um novo lugar para ele, mas tem condições para aprender a jogar lá. Quero mantê-lo. E é um verdadeiro portista e um homem forte, de carácter forte. Precisamos de jogadores assim.
16 - "O FC Porto sabe escolher os reforços"
P-Há alguns anos, pessoas do FC Porto queixavam-se de um treinador que conhecia muito mal o mercado estrangeiro. O Co Adriaanse sente-se à vontade nessa área?
R-Sim. Temos uma relação boa e aberta com o departamento de prospecção, o Antero Henrique e o presidente para falarmos disso.
P-Tem a sua própria lista?
R- Claro. Não conheço o mercado do Brasil. Conheço um pouco o mercado português, que eles conhecem muito melhor do que eu. O FC Porto ganhou muitos títulos, por isso sabe escolher bons reforços. Deram-me os jogadores com que ganhei o campeonato e a Taça. Eles é que escolheram. Só escolhi um, o Fatih Sonkaya, e foi no último instante, quando se percebeu que o Kromkamp não vinha.
P-É importante que os reforços conheçam o campeonato português?
R-É uma vantagem que conheçam a língua, os estádios, os adversários...
P-Foi um dos motivos da contratação do Adriano?
R-Uma vantagem, sim, mas o mais importante é a qualidade dos jogadores. Não importa o país. Tem as qualidades necessárias para jogar numa posição dentro do nosso sistema? Isso é que interessa.
17 - "Liguei a Koeman lhe desejar sorte para no PSV"
P-Jogou nove vezes com Koeman e nunca ganhou. Como é possível?
R- É normal. As pessoas em Portugal não me conhecem porque não fui um jogador conhecido internacionalmente. Ninguém conhece o AZ, ou o Willem II, apenas o Ajax. E as pessoas dizem muitas vezes que nunca ganhei nada, mas a verdade é que ganhei tudo na Holanda, antes de vir para Portugal. Qualquer treinador que consegue resultados melhores do que o orçamento de que dispõe, e se as suas equipas jogam bem, também é um treinador campeão. Com o Den Haag, com o Willem II ou com o AZ não se pode ser campeão nacional. Nem o Mou-rinho, nem o Koeman, nem eu: ninguém. Portanto, não é justo dizer que não ganhei títulos. Ganhei alguma coisa em todas as equipas que treinei. Com o Zwolle, passei da segunda para a primeira divisão. Com o Den Haag, da segunda divisão para a primeira. Como treinador do Ajax, fui cinco vezes consecutivas campeão da Holanda com os juniores. No primeiro ano enquanto técnico principal do Ajax, fiz uma equipa inteiramente nova, fiquei em terceiro e fui àTaça UEFA, isto quando nos anos anteriores o Ajax tinha ficado em quarto e quinto. No segundo ano, estávamos em segundo a apenas um ponto do primeiro e despediram-me porque tinha problemas com a administração. Com o Willem II, fui à Taça UEFA depois de 32 anos sem competições europeias. No segundo ano, fomos à liga dos Campeões. São grandes objectivos para pequenas equipas. Por isso, quando se olha para o currículo de um treinador não se pode concluir que não ganhou nada só porque não tem títulos. Perdi oito vezes com Koeman? Sim, claro. Se ele treina o Ajax e eu o Willem 11 é natural que ganhe.
P-Também aconteceu consigo no Ajax e ele no Vitesse. Koeman sabe alguma coisa sobre si que usa e que nunca falha?
R- Acho que são mais os jornalistas que usam algumas coisas contra mim. Tenho uma excelente relação com o Koeman, que é um excelente treinador e uma pessoa fantástica. Aliás, liguei-lhe a desejar-lhe toda a sorte com o PSV Eindhoven.
P-Disse uma vez que era mais ofensivo e Koeman mais defensivo. Mantém essa posição?
R-Não sou só eu que o digo. Qualquer treinador, qualquer jogador ou jornalista holandês sabe que sou o treinador mais ofensivo da Holanda. Todos os outros treinadores têm filosofias muito mais defensivas. Hiddink, Koeman, todos têm uma postura mais defensiva. Sou o único que jogou um futebol de ataque com todas as suas equipas. Agora, como é óbvio, quando corremos riscos, acabamos por perder algumas vezes. É a natureza do jogo.
18 - "Temos de ser um exemplo de fairplay"
P-Durante uma boa parte da época, pareceu claro que os adeptos não estavam consigo. Acha que isso mudou definitivamente? Na próxima terá os adeptos pelo seu lado?
R-Nunca se sabe, mas conto com isso. Na próxima época, começamos com zero. Vamos esquecer os prémios. Temos de trabalhar duramente se queremos ser campeões outra vez. Queremos ganhar a Taça e queremos marcar mais golos. Pretendemos uma média de dois por jogo: em trinta jogos, sessenta golos nomínimo. Sofrer menos é difícil, porque 15 ou 16 é um número muito bom; portanto, é natural que na próxima época soframos mais. Também queremos menos cartões amarelos; na próxima época temos de ser os primeiros no ranking do fairplay: se temos a bola, se controlamos o jogo, não podemos levar cartões. Só se pode levar amarelo quando não se tem a bola e quando o nosso comportamento não é bom. Temos de ser um exemplo de fairplay. Profissionais, com certeza: o Paulo Assunção tem de fazer um tackle, tudo bem, é futebol, mas vi muitos cartões amarelos desnecessários. Liga dos Campeões: pretendemos uma performance melhor do que a da última época, claro. Depende, evidentemente, dos nossos adversários. Se tivermos o Barcelona no primeiro jogo, é difícil; se começarmos contra um clube pequeno, é mais fácil. Na Liga dos Campeões, também é necessária alguma sorte com os adversários, mas é óbvio que temos de fazer melhor. Seja como for, é difícil sermos campeões outra vez, ganhar a taça outra vez, fazer mais na "Champions" em ser outra vez o melhor treinador em Portugal. Mas temos de tentar.
P- Mencionou a importância que da à disciplina. Até que ponto lhe deu trabalho?
R- Não muito. Os jogadores foram disciplinados desde o início. Ouvi muitas histórias, mas nunca precisei de multar ninguém. Se um jogador se atrasa num treino, leva um amarelo; da segunda vez, fica obrigado a chegar uma hora mais cedo no dia a seguir; da terceira, uma semana completa. Acontece. Queixam-se do trânsito, muito bem, então devem sair mais cedo de casa. Eu também apanho trânsito. Mas acho que a disciplina foi boa. As regras são claras: chegar cedo, usar as caneleiras. Regras normais. Só pedimos o comportamento normal nurrtgrupo. Se o explicamos e o controlamos, não temos problemas:. Eu nunca tive problemas corpos-meus grupos na Holanda.
O novo campeão nacional começou a época com um treinador sem títulos mas de espírito aberto, apóstolo da necessidade de ter uma relação cristalina com a Imprensa para que os adeptos estivessem conveniente e saudavelmente informados, e acabou com outro, já com títulos e convencido de que em Portugal a abertura não funciona. Felizmente, o holandês fez regressar por um bocadinho o antigo para uma entrevista cheia de explicações, notícias e, por que não?, ensinamentos. Compreensivo para com Scolari, paternal para Quaresma, implacável para Ricardo Costa - não sai! - e elogioso para muitos. O FC Porto, Paulo Assunção, Co Adriaanse...
Podíamos escrever que falta a esta entrevista uma pergunta e que foi de propósito, mas a verdade é que falta uma pergunta e não foi de propósito. Cinco meses silenciosos e silenciados deixam um lastro demasiado grande para a curta hora e meia que Co Adriaanse aceitou destinar à primeira grande entrevista a um jornal português: em suma, não lhe perguntámos até que ponto ficou feliz e contente com os primeiros títulos da carreira. A consolação é que outras partes terão forçosamente escapado a esta verdadeira autópsia de uma época e a metáfora não está exagerada, porque o holandês gosta de ir ao detalhe quase científico para explicar as suas ideias. Que são diferentes, que o FC Porto já conhecia muito bem quando o contratou e que, se mudanças sofreram durante o tormentoso percurso, foi sempre para dar um passo em frente e nunca, mas nunca, atrás. Se alguma certeza sai deste trabalho é que Adriaanse não recua, aliás, recua ainda menos do que admite, porque, para quem decidiu fechar-se à Imprensa, as próximas páginas não poderiam conter mais informação, revelações e até velhas histórias finalmente decifradas, como as de Jorge Costa, Postiga, Diego, do avançado holandês que o FC Porto quis roubar ao Ajax e os segredos de Quaresma. Fica alguma coisa por escavar na troca de Baía por Helton. Ah, e foi tudo em inglês.
O JOGO | O livro mais conhecido a seu respeito tem um título estranho: "Eu nunca cometo erros"...
R| ...não fui eu que disse isso.
P | A pergunta é: cometeu erros esta temporada?
R | Claro. Tive de tomar duas mil decisões e ninguém consegue tomar duas mil decisões acertadas. Portanto, também tomei más decisões, mas isso é normal. De resto, não consigo lembrar-me de exemplos concretos.
P | Qual é a explicação para o título do livro?
R | Saiu de uma conferência de Imprensa antes da meia-final da Taça UEFA, no AZ Alkmaar. O AZ é um clube muito pequeno e ter chegado lá foi um milagre. De repente, um jornalista perguntou: cometeu erros esta temporada? Erros? Estávamos na meia-final da Taça UEFA e em segundo lugar no campeonato holandês; durante 23 anos o AZ não conseguiu jogar nas competições europeias. Como podiam estar a falar de erros, a colocar aquela pergunta? Se o AZ fosse o segundo a contar do fim, então faria sentido. E, nesse contexto, respondi que achava não ter cometido erros porque estávamos na meia-final da Taça UEFA e estávamos melhor do que Ajax e Feyenoord, na Holanda. Tiraram isso de contexto e disseram que eu não cometo erros. Claro que cometo erros, talvez cometa menos erros que alguns dos outros treinadores.
P | Diria que cometeu menos erros do que os outros?
R | Diria que cometi erros, mas que nos podemos dar por satisfeitos. Prometi ao clube o campeonato e a Taça; prometi fazer muitos golos e prometi um bom comportamento na Liga dos Campeões. Dessas promessas, só a última não foi cumprida, mas quando se ganha o campeonato e a Taça, podemos dar-nos por satisfeitos. Não tenho dúvidas de que foram mais as decisões acertadas que tomei do que os erros que cometi.
P | Que palavra descreveria melhor a sua relação com os jogadores esta temporada: investigação ou educação?
R | Investigação. Quando cheguei, só conhecia os jogadores por DVD. E isso é completamente diferente de os conhecer pessoalmente, durante os treinos e durante os jogos. Só depois disso é que se consegue saber o verdadeiro potencial dos jogadores. Tive que investir muito tempo nos jogadores mas também na estrutura do clube, no sentido de conhecer melhor o presidente, o departamento médico, todo o staff. Conhecia o Rui Barros como jogador, mas não como pessoa e não como técnico e tive que investir algum tempo nele. Não conhecia grande coisa sobre o futebol português, sobre as ideias dos outros treinadores, sobre os estádios ou até sobre a qualidade dos relvados, e sobre os jornais desportivos diários, que não existem na Holanda. Lá só temos uma revista por semana. É muita coisa diferente e tive de investir muito tempo na investigação de todos esses aspectos para aprender mais e mais sobre o futebol português. A própria língua.
P | Isso serve de explicação para o facto de jogadores tão importantes como Pepe e Paulo Assunção não terem sido titulares no início da temporada?
R | Eles também não jogavam na anterior. O Pepe não estava na equipa titular e o Paulo Assunção estava na Grécia. Tive de fazer uma equipa e isso não se consegue numa semana.
P | Mas estão diferentes agora? Foram eles que mudaram?
R | Acho que qualquer jogador só se pode desenvolver se jogar. Se não jogar, ninguém o pode ver e analisar a sua evolução. O Pepe e o Paulo Assunção fizeram muitos jogos e as pessoas viram o que faziam, tal como aconteceu com o Quaresma ou o Lucho. Mas o Diego, por exemplo, não jogou tantas vezes e não teve oportunidade de se desenvolver. Só eu é que o via nos treinos e as pessoas não percebiam as minhas opções. O Ibson também é bom jogador, mas não pôde jogar muito porque tenho o Lucho para aquela posição.
P | Curiosamente, deu ao Ibson a camisola 6, um número que o colocava num lugar diferente, de acordo com o seu próprio método...
R | No início, o clube pediu-me para dar números aos jogadores. Isso aconteceu na terceira ou quarta semana de trabalho. O Ibson estava a jogar como médio direito e eu disse que, sim senhor, ele era muito bom jogador e podia ficar com a camisola 6. Na altura, não o conhecia muito bem, nem ao Lucho, nem à maior parte dos outros e tive de perceber quais eram as capacidades de cada um para depois poder construir uma equipa de acordo com as minha ideias. E as minhas ideias são diferentes das dos outros treinadores. O FC Porto conhecia-me muito bem quando me pediu para vir para cá. Conhecia a minha personalidade, a minha filosofia de treino, a minha visão sobre o futebol. Sabiam bem quem eu era e precisavam de alguém que fosse capaz de tomar decisões. Havia muitos jogadores, cerca de 32 ou 33, e era preciso fazer escolhas. Era preciso escolher uma equipa, uma equipa que ganhasse e da qual os adeptos gostassem. Foi isso que tentei fazer.
2- "Falámos em sair depois do ataque de que fui alvo"
P | Pensou em voltar à Holanda depois do incidente com o seu carro no Olival?
R | Ficámos muito preocupados, eu e os meus colegas. Wil Coort estava ao meu lado no carro quando tudo aconteceu. Estávamos em primeiro lugar no campeonato, tínhamos acabado de chegar de Vila do Conde, onde empatámos 0-0, comigo na bancada, depois de uma decisão incrível no jogo da Taça. Sou um treinador correcto no banco porque acho que o nosso trabalho é feito durante a semana e os jogadores sabem o que devem fazer durante os jogos. Só me levanto quando sinto a necessidade de mudar alguma coisa na equipa e sou sempre muito correcto, portanto, não percebi aquela decisão de me suspenderem. Aquele incidente fez-nos pensar. Se as pessoas são tão agressivas, o que estamos aqui a fazer? Sou um homem correcto, estou a trabalhar duro, tenho uma intenção positiva, estou a fazer bem o meu trabalho, então porquê tanta agressividade? Falámos na hipótese de sair, mas o presidente e o Antero Henrique falaram connosco, disseram que estavam do nosso lado, que nos apoiavam, que nos queriam aqui e sublinharam que se tratava apenas de um pequeno grupo de pessoas. Aliás, os portugueses são muito gentis, mas em todas as sociedades há pessoas loucas. Decidimos ficar e mostrar carácter perante os jogadores, deixando claro que não nos afugentavam com aquilo que não passa de um comportamento criminoso
3 - "Se mudei, foi para me aproximar ainda mais da minha filosofia"
P | Foi complicado trabalhar com um grupo de jogadores que não tinham sido escolhidos por si?
R | Não, isso é normal. Sabia, quando vim, quais eram os jogadores de que o FC Porto dispunha e com quem iria trabalhar. Eu sou o profissional e a minha missão era escolher, decidir e fazer encaixar todas as partes. Para mim, isso nunca foi um problema. O FC Porto ganhou muitos títulos antes de eu cá chegar e é um clube que conhece muito bem o mercado e que compra excelentes jogadores. Só se pode ganhar um campeonato com bons jogadores e foi isso que eles me deram: excelentes jogadores. Sem eles nunca teria construído uma equipa vencedora.
P | Mudou, pelo menos, algumas das suas concepções ao longo da temporada?
R | Não, de todo. Foi exactamente o contrário. Ao longo da temporada fui conseguindo implementar mais e mais os meus conceitos e as minhas ideias, porque leva muito tempo a ensinar os jogadores e a treinar determinados conceitos.
P | Visto do lado de cá, ficou a ideia de que tinha mudado...
R | Talvez, mas apenas para me aproximar cada vez mais da minha filosofia. A equipa mudou radicalmente depois do Estrela da Amadora. Achei que esse era o momento certo para dizer 'acabou' e para tornar a equipa absolutamente fiel aos meus conceitos e à minha filosofia de jogo.
P | No início da temporada, o FC Porto jogava um futebol muito ofensivo e criativo. Actualmente, parece ser uma equipa mais contida, mais calculista. O que aconteceu?
R | Fazer uma equipa é um processo demorado. Mais ainda para jogar no sistema que nós utilizamos. Jogar como nós fazemos é muito, muito difícil. É fácil jogar na contenção, com toda a gente a recuar quando perde a bola, reduzindo os espaços para defender. Quase todos os treinadores em Portugal jogam dessa forma. É muito, muito fácil. E quando se consegue a bola, chuta-se para a frente e espera-se que um golpe de sorte resolva o jogo. É muito fácil. Pôr a equipa a jogar como o FC Porto faz agora, é muito difícil e leva tempo.
4- Mudei o sistema para atacar mais, eficácia na defesa foi coincidência
P | Como chegou ao actual onze do FC Porto?
R | É como ter um "puzzle". Fui tentando várias combinações, trocando impressões com os meus assistentes até chegar a uma equipa com uma filosofia de jogo. De tal maneira que, se um sair, entra outro para o seu lugar, mas a equipa continua na mesma. Dei um bom exemplo disso contra o Boavista, no último jogo. Usei um onze completamente novo, mas o sistema e a forma de jogar foram os mesmos. Aliás, essa equipa que defrontou o Boavista jogou muito, muito bem, especialmente na primeira parte, talvez até tenha jogado melhor do que a equipa titular. Era um jogo complicado, um dérbi da cidade que o Boavista precisava de ganhar, mas eles estavam frescos e motivados, até por terem reagido bem à pressão de dizerem que se tratava da segunda equipa do FC Porto. Queria muito ganhar esse jogo, quer por tudo o que se disse antes, quer pelos próprios jogadores, que são muito bons e que mereciam jogar mais vezes.
P | Bosingwa foi o primeiro trinco do novo sistema e Paulo Assunção ficou no banco. Porquê?
R | A posição ocupada pelo Paulo Assunção é a mais difícil. Acho que o Bosingwa tem condições para a fazer, talvez até mais do que o próprio Paulo Assunção. O Bosingwa é muito rápido e o Paulo nem por isso, o que o obriga a fazer alguns "tackles" para travar os adversários. No entanto, o Paulo é um jogador muito inteligente e estável, capaz de pensar sempre na equipa. Contudo, em termos de características, o Bosingwa pode ser melhor para aquela posição, porque temos sempre muito espaço atrás dos defesas e precisamos de jogadores rápidos. Mas para ele ser útil ali tem de crescer como jogador, para ser mais estável.
P | Não será um problema na próxima Liga dos Campeões ter jogadores mais baixos, como é o caso do Paulo Assunção?
R | Sim, um jogador mais alto poderia ser uma vantagem. Mas se o Paulo fosse dez centímetros mais alto e se fosse mais rápido, estaria a jogar no Arsenal ou no Chelsea ou no Milan ou na Juventus. Tenho muita sorte que ele seja um pouco mais baixo e que esteja por cá. É um grande profissional e um trabalhador incansável nos treinos, tal como é nos jogos.
P | O sistema mudou depois do jogo com o Estrela para que a equipa atacassse melhor ou defendesse melhor?
R | Para atacar melhor.
P | Pois, mas em vez de marcar mais golos, passou a sofrer menos...
R | Sim, mas isso não teve a ver com o sistema, antes com a eficácia dos jogadores. Nós criamos muitas oportunidades, mas temos dificuldades para as concretizar. Eu crio as condições para os jogadores estarem no ataque. A bola está sempre no ataque e nós temos cinco ou seis boas oportunidades todos os jogos. Devíamos conseguir uma média de, pelo menos, dois golos por jogo.
P | Nesse caso, os resultados conseguidos pela defesa são uma coincidência?
R | Sim. Mudei o sistema porque não estávamos a marcar golos suficientes e porque não estávamos a pressionar o suficiente os adversário. Quando pressionamos os adversários, é mais provável que comentam erros e que nos proporcionem mais oportunidades. E o facto é que tivemos muitas oportunidades mas não conseguimos concretizá-las. Contudo, como pressionamos logo no ataque, é muito difícil para as equipas chegarem à nossa baliza, há uma enorme distância a percorrerem. Essa é a razão para sofrermos tão poucos golos. Muitas vezes, o Vítor Baía e o Helton acabavam os jogos com uma ou duas defesas.
P | De certa forma, encontrou sem querer o ovo de Colombo...
R | Sim, mas não era de uma solução para defender melhor que andava à procura. Era uma solução para atacar. Funcionou, tirando o desperdício de lances. Há um exemplo disso com o Setúbal, na final da Taça. Estava 1-0 e um golpe de sorte do Setúbal podia ter mudado tudo. Estava preocupado. Podíamos ter marcado quatro ou cinco vezes, mas sofremos até ao fim e isso é um pouco a imagem do FC Porto deste ano: atacámos muito mas marcámos pouco. McCarthy podia ter marcado pelo menos 15 golos esta temporada e não foi além de três. Em compensação, o Lucho marcou dez, apesar de ser médio.
P | Adriano foi importante para dar eficácia ao ataque?
R | O Adriano conseguiu uma excelente média de golos por jogo e foi muito importante nesta segunda fase do campeonato. Foi uma excelente escolha do presidente.
P | Já o conhecia?
R | Não, não o conhecia. Foi uma prenda do presidente. Falei com o Rui Barros, que é muito importante para nós, porque conhece muito bem os jogadores. Ele disse-me que o podíamos usar e tinha razão. Não precisei de mais do que cinco minutos de treino para perceber que se tratava de um bom jogador. Falei com ele antes e percebi na sua atitude, na sua entrega, que era um jogador que podia usar de imediato. De resto, ele não é importante apenas dentro do campo, mas também para criar um bom ambiente e espírito de equipa.
5 - "Se tivesse dinheiro comprava um avançado que garantisse golos"
"Tentámos comprar o Huntelaar, mas ele não quis emigrar. Foi uma atitude inteligente da parte dele. É muito novo e quer afirmar-se no Ajax e na selecção holandesa antes de pensar em sair"
P | Carlos Queiroz acha que Co Adriaanse só podia ter sido campeão no FC Porto ou no Manchester, por considerar que clubes menos sensatos tê-lo-iam despedido durante a fase mais complicada da temporada. Concorda?
R | Não me parece. Cheguei aqui com o clube numa situação complicada. Tinham despedido três treinadores num só ano, os adeptos estavam descontentes e os resultados não existiam. Quando se começa assim, tão mal, leva algum tempo a construir uma equipa capaz de jogar bem. E nós nem sequer jogávamos mal no início. Jogávamos bom futebol, mas não tínhamos sorte. Podíamos ter ganho ao Glasgow Rangers, podíamos ter ganho ao Artmedia e podíamos ter empatado em Glasgow. Por que deveria a Direcção despedir um treinador que estava a fazer um bom trabalho? Acho que outras administrações teriam percebido o mesmo e teriam tomado a mesma posição, mantendo a confiança.
P | Já usou o seu sistema na Europa com êxito, contra o Villarreal, por exemplo. Significa que ele é utilizável na Liga dos Campeões?
R | O sistema não é importante. Depende do jogo. A minha equipa sabe como jogar de várias formas, 4x3x3, 3x3x4, 3x4x3. Somos muito flexíveis.
P | A propósito ainda da Liga dos Campeões, acha que o FC Porto era uma equipa menos pragmática nessa altura da temporada?
R | Fomos infelizes nesses jogos, mas acho que a equipa é muito mais madura agora. Isso aconteceu em Setembro e Outubro. Passou quase um ano. Estamos bem melhor agora.
P | No jogo de Glasgow e depois no de Milão mostrou-se preocupado com a altura dos jogadores da defesa do FC Porto. Acha que há aí um problema potencial também para a próxima temporada?
R | No futebol internacional, o tamanho, a velocidade e a força são muito importantes. Se conseguirmos controlar o jogo, pode não ser um problema. A equipa do Barcelona também não é muito alta e joga muito bom futebol.
P | Mas o Barcelona tem jogadores altos em posições-chave...
R | O Barcelona tem excelentes jogadores em todas as posições, porque os pode comprar. Nós não o podemos fazer. É como ter um jardim. O FC Porto tem de plantar aquilo de que precisa e esperar que cresça. Enquanto isso, Chelsea ou Barcelona vêem o que nós plantámos e compram já crescido. E nós voltamos a ter de plantar. Essa é a grande diferença, mas comprar uma equipa também é complicado. Quando se faz tudo desde o início, pode planear-se a estrutura e conseguir uma equipa tão forte como as dos outros. Mas, para isso, é muito importante poder manter todos os meus jogadores. O Pepe não pode sair, o Paulo Assunção não pode sair, o Helton não pode sair, o Lucho não pode sair, o Quaresma não pode sair e o Adriano tem de ficar.
P | Tem medo de que esse êxodo aconteça?
R | Sim, tenho. Se fosse o treinador de um clube com muito dinheiro compraria dois ou três jogadores, assim tenho que esperar que estes não saiam. Tenho medo, mas espero que ninguém consiga percebê-lo.
P | Se tivesse esse dinheiro, de que jogadores precisaria?
R | Precisaria de um avançado que me conseguisse garantir golos...
P | Huntelaar, que era do Herenveen e agora joga no Ajax, por exemplo?
R | Tentámos comprar o Huntelaar, mas ele não quis emigrar. Foi uma atitude inteligente da parte dele. É muito novo e quer afirmar-se no Ajax e na selecção holandesa antes de pensar em sair para o futebol inglês ou alemão. Mas um avançado que garanta golos é a posição mais importante de qualquer equipa.
P | Há outras prioridades para além do ponta-de-lança?
R | Extremos que sejam muito eficazes nos cruzamentos.
P | Como o Diogo Valente?
R | Sim, ele é muito bom nesse último passe. Nós temos alguns bons extremos. Alan, por exemplo, pode jogar no lado direito e no lado esquerdo, é um excelente jogador de equipa, mas tem alguns problemas no último passe.
P | E da formação, não há jogadores que possam transitar para a equipa principal?
R | Gosto do Hélder Barbosa. Pode jogar no lado esquerdo e no meio-campo. O Anderson é mais médio do que extremo. Disseram-me que era um extremo capaz de jogar nos dois lados, mas eu acho que ele é um típico número dez ou um médio esquerdo. Gostei muito de o ver jogar com o Boavista no meio-campo.
P | Aquela foi a primeira vez em que ele teve de defender em toda a carreira, não foi?
R | Não, de todo. Ele disse-me que jogou muitas vezes como lateral-esquerdo no Brasil. Também não sabia, mas a verdade é que durante os treinos o usámos como lateral e ele saiu-se bem, porque é muito forte e está sempre concentrado. Acho que a melhor posição para ele é a dez ou como médio esquerdo, porque também sabe defender.
6- "Espero muito do Anderson"
P | Porque razão experimentou Anderson e depois esteve tanto tempo sem o utilizar?
R | Porque vi que ele não estava pronto para a nossa equipa.
P | Não foi porque tivesse medo de que a Imprensa o estragasse?
R | Não. Só tinha dezassete anos. Chegou sozinho do Brasil, a um ambiente novo e pensava que era o melhor do Mundo, porque todos os dias lia isso n'O JOGO. Houve muita publicidade durante meio ano. Eu próprio pensei que não voltaríamos a perder, porque vinha aí o Anderson, que é tão bom jogador.
P | E não é?
R | Ainda não.
P | Vai ser?
R | Sim. Espero muito do Anderson na próxima época, porque nessa altura estará habituado ao país, aos colegas, à nossa forma de jogar, etc, etc. É um jogador multifuncional. Podemos usá-lo como ponta-de-lança, como lateral-esquerdo, mas a melhor posição é no meio-campo, pela esquerda.
7- "Quaresma estará na selecção no prazo de um ou dois anos"
P | Aquelas primeiras notícias sobre a sua preocupação com a disciplina incomodaram-no tanto como pareceu?
R | Sim, porque não era verdade. Ninguém me conhecia em Portugal e, de repente, toda a gente me chamava general e dizia que eu não deixava ninguém fazer nada. Mas, se perguntassem aos jogadores, eles teriam dito que não, que era tudo normal.
P | Mas começou por ser o presidente do FC Porto a descrevê-lo como um disciplinador...
R | Não sabia. Acho que é errado pensar-se em mim como um disciplinador. Co Adriaanse é um treinador de futebol. Se perguntarem na Holanda, os jogadores dirão que o Co Adriaanse gosta de disciplina mas é honesto e tem um comportamento normal, nunca faz nada que fuja à normalidade. É como numa família. Tem-se um pai, uma mãe, uma criança e precisa-se de regras: lava os dentes, lava as mãos, limpa as tuas roupas, tem cuidado, não digas falsidades a respeito de ninguém. Coisas normais. Como pai ou como mãe, somos responsáveis pela nossa criança.
P | Num livro sobre o Ajax de Van Gaal, de que o Co Adriaanse fez parte, percebe-se como o individualismo é combatido e como as tentativas de destaque, a cor das botas, o penteado, o automóvel, são consideradas prejudiciais. Não é o seu pensamento?
R | Também é um processo evolutivo. No futebol actual, os jogadores são estrelas de cinema. Quaresma é uma estrela de cinema. Estão todos os dias nos jornais, na televisão, todas as semanas mudam de penteado, guiam carros caros e aparecem acompanhados por mulheres bonitas. Não se pode combater isso. Eu prefiro jogadores mais normais. O Paulo Assunção não usa brincos, chega sempre a tempo, nunca, nunca se atrasa. Mas também precisamos de Quaresma. As pessoas gostam de espectáculo e ele tem algo de especial nos pés. Um gesto de Quaresma pode dar em golo. Decidiu muitos jogos para nós. Porém, também é preciso ensiná-lo. 'OK, Ricardo, és um jogador especial, gosto de ti, as pessoas gostam de ti, mas não é espectáculo para 90 minutos e se estiver 0-0 tens de jogar para a equipa. Se estiver 3-0, podes dar o teu show. Porta-te bem'. O golo do Jorginho em Alvalade foi o mais importante de toda a época, mas a atitude do Quaresma também podia ter sido decisiva. Se o árbitro lhe tivesse dado vermelho, e devia ter dado, passaríamos a jogar com dez e o Sporting talvez ganhasse e talvez acabasse campeão na nossa vez. Foi preciso dizer ao Ricardo 'não voltes a fazer isso, estás a ganhar-nos o campeonato com as tuas acções, com os teus cruzamentos, mas também podes perdê-lo'. Tem de aprender. Se aprender, será um jogador melhor.
P | Há quatro extremos melhores do que Quaresma nos convocados da selecção portuguesa?
R | Figo e Ronaldo são melhores. Figo tem muita experiência.
P | Há mais dois.
R | Pois, o Boa Morte e o Simão. O Simão é muito experiente e muito bom nos livres. Muito bom. Fez muitos golos para o Benfica. Mas o Quaresma estará na selecção, com toda a certeza, no prazo de um ou dois anos.
P | Ele agora é extremo-direito ou esquerdo?
R | Enquanto extremo-direito, se não pode fugir por fora para cruzar, vai para o interior do campo e perde a bola; se estiver na esquerda e for para dentro, pode protegê-la, porque é dextro, e tem um bom remate dessa posição. Contra o Guimarães, fez um golo assim. É típico dele. Tem ainda outra vantagem: se estiver na esquerda, a driblar, consegue aquele cruzamento muito rápido com o pé direito. Mas fá-lo demasiadas vezes. Aliás, agora, faz sempre com o pé direito. Tenho de dizer-lhe, 'Ricardo, usa também o pé esquerdo', até porque o pé esquerdo dele também é muito bom. O que acontece é que, cruzando com o direito, muitos cruzamentos são demasiado baixos e fáceis de defender. Mas o Ricardo é assim. Tenho de ensinar-lhe quando procurar o interior do relvado, quando usar aquele típico cruzamento de pé direito, quando usar o cruzamento com o pé esquerdo, a melhorar os cantos, os livres...
P | E está a funcionar?
R | Está a funcionar. Acho que o Ricardo é melhor agora do que era há um ano.
P | Tem margem para melhorar ainda mais ?
R | Pode melhorar sim, porque tem muito talento e uma mente aberta. Tenho uma boa relação com ele. É difícil, porque estamos a falar de uma personalidade muito especial, mas o nosso relacionamento é bom.
8- "Scolari tem uma intenção positiva"
P | O sucesso do seu sistema teve alguma coisa que ver com a filosofia defensiva das equipas mais pequenas do campeonato português?
R | Não, é sempre muito difícil ganhar qualquer jogo. É difícil para nós, para o Sporting e para o Benfica porque as equipas estão muito bem organizadas e são tacticamente muito disciplinadas. Na Holanda, até as equipas mais pequenas tentam atacar, mas aqui qualquer treinador fica contente com um empate.
P | Acha que o seu FC Porto pode ajudar a mudar isso?
R | Temos de pensar que vivemos todos à custa do futebol. Estamos todos envolvidos nisto e todos temos a responsabilidade de melhorar o nível do espectáculo para que as pessoas venham aos estádios e para que as crianças torçam pelo FC Porto, pelo Benfica, pelo Sporting ou pelo Braga e para que queiram jogar futebol. Essa é a nossa missão no futebol. Não nos podemos limitar a criticar os árbitros, os outros treinadores ou os outros jogadores. Vamos falar sobre futebol e vamos elevar o nível do futebol. Temos todas as condições para isso. As pessoas em Portugal adoram futebol, são loucas pelo jogo, mais do que na Holanda. Esta história com o senhor Scolari é descabida. Ele tem uma intenção positiva em relação a Portugal. Tem de escolher e não deve ser criticado por ter escolhido este e não aquele. Ele sabe quais são os jogadores com que conta e tem um plano. Então, devemos ter uma atitude positiva e, depois dos jogos, depois dos resultados, aí sim, podemos perguntar porque jogou assim e não de outra maneira.
P | Curiosamente, antes do Europeu, deu uma entrevista sobre o seleccionador Dick Advocaat, dizendo que queria que a Holanda perdesse, porque achava as ideias dele prejudiciais para o futebol holandês...
R | Sim, mas expliquei porquê. A Holanda joga no mesmo estilo das minhas equipas. Por outro lado, Advocaat é um treinador muito defensivo. Quando não se tem jogadores de muita qualidade, como era o caso dele, e a prioridade é defender, pode conseguir-se ganhar um ou outro jogo, mas não se consegue ganhar campeonatos. Para isso é preciso correr riscos e surpreender o adversário. Mas não o critiquei. Não podia era alimentar falsas esperanças nas pessoas em vésperas da competição. Conheço bem o jogo e sabia o que ia acontecer.
9 - "Lucho será melhor na próxima época"
P | Acha que o Lucho esteve a cem por cento esta temporada?
R | Não, mas é natural. Ele não teve férias no último ano e esta época pode ter apenas três semanas, se conseguir chegar à final do Mundial. Se isso acontecer, vai perder as primeiras três semanas de trabalho connosco, mas ele precisa desse descanso. Acho que, se ficar cá, será certamente melhor jogador do que foi esta temporada.
P | Concorda que o Lisandro voltou das férias de Natal em baixa de forma?
R | Sim, mas também foi afectado pelo facto de não jogar. Ele fica muito triste quando não joga e tenho de falar com ele para o motivar, para continuar a treinar. Mas agora também o conheço melhor e sei que ele não é um extremo, é outro número dez. Ele precisa de jogar nas costas de um grande avançado para poder surgir na área a marcar golos, que é algo que ele faz com uma grande facilidade. Não se consegue fazer muitos golos nas alas e é por isso que ele tem de jogar à frente da baliza, perto da área. Mas para essa posição temos muitos jogadores.
P | Muitos jogadores para deixar sair?
R | Alguns sim, porque é melhor para eles e para o clube. É algo que teremos de analisar a fundo.
10 - "Saída de Baía foi a decisão mais difícil"
P | Porque razão escolheu Baía naquele particular com o Tottenham, em Agosto, quando decidiu quem seria o titular na baliza?
R | Tivemos de tomar uma decisão. Naquele momento, juntando tudo, achámos que era a melhor.
P | Porque era o melhor guarda-redes, porque era uma figura importante...?
R | Juntámos todos os aspectos. Muito importante, por exemplo, é que toda a gente conhece o Baía, toda a gente confia nele: os jogadores, os adeptos, a Imprensa. Os próprios adversários têm respeito por ele. Se trazemos algo de novo, estamos a enfraquecer a equipa. O aspecto psicológico é muito importante e a qualidade de ambos é similar. A única diferença é que Helton é mais novo e tem mais anos de carreira pela frente. Estou muito contente por ter dois guarda-redes tão bons. Mais o Bruno Vale, mais o Paulo Ribeiro...
P | Mudou de opinião a respeito do guarda-redes titular porquê?
R | Porque dispus de meia época para observar e porque, naquela altura, achei melhor utilizar o Helton.
P | Teve alguma coisa a ver com o sistema? Com o facto de o Helton ser mais desenrascado com os pés?
R | Não. Nada a ver.
P | Admite que foi um pouco insensível ao fazer a mudança precisamente depois de um mau jogo do Baía?
R | Não tomamos decisões apenas por um jogo. Naquele momento tinha muita informação sobre todos os jogos que ele fizera, todos os treinos...
P | Mas a imagem que transparece não é essa e podia ter sido evitado...
R | Não tiro um jogador porque comete um erro num jogo. A razão não foi essa. Foi a decisão mais difícil, para mim, na época inteira. E expliquei-a ao Baía.
P | Ele reagiu bem?
R | Ficou desapontado, claro, mas a sua reacção foi absolutamente de top. Esteve sempre com a equipa, apoiou sempre o Helton, foi sempre positivo no banco. Agradeci-lhe duas vezes, depois do jogo com o Penafiel, e voltei a fazê-lo na final da Taça. A minha ideia era fazê-lo entrar outra vez, durante a final, mas não foi possível, porque tive de alterar a equipa. Se tivéssemos marcado mais golos e se ainda tivesse substituições para fazer, ter-lhe-ia oferecido os aplausos dos adeptos. Ele merecia-os.
11 - "Não conheço o seleccionador"
P | Alguma vez conversou com Scolari?
R | Nunca o conheci.
P | É um procedimento normal?
R | Se eu fosse o seleccionador, observava todos os jogadores mas também comunicava com o treinador, porque talvez ele pudesse dar-me uma informação que desconhecemos. E é bom para o futebol que o seleccionador ajude os treinadores. Talvez eu pudesse aprender alguma coisa com ele e talvez ele pudesse saber mais alguma coisa a respeito dos jogadores do FC Porto.
P | Está a cometer um erro?
R | Não. É o estilo dele. Se fosse eu, falava com o Paulo Bento, com o novo treinador do Benfica, do Braga... Se estivesse interessado num jogador, perguntava por ele. Talvez devesse também observar treinos, para além dos jogos, porque vê-se muita coisa nos treinos.
12 - "FC Porto é campeão do Mundo da organização"
P | Já elogiou bastantes vezes a organização do FC Porto. A pergunta que lhe fazemos é: o Co Adriaanse trouxe-lhe alguma coisa de novo?
R | Tem de perguntar às pessoas que estão à minha volta.
P | Pode dizer-me se mudou alguma coisa.
R | Nada. O FC Porto é clube muito bem organizado. Condições de top nos treinos, estádio de top, muita gente à minha volta, apoiando-me directamente; muito, muito bom staff médico. Tivemos poucas lesões esta época e quando as houve os jogadores rapidamente estavam de volta, duas vezes mais depressa do que na Holanda. Nesta altura, não temos equipa nem jogadores para ser campeões do Mundo, mas a organização do FC Porto é-o. Para mim, é uma honra trabalhar aqui.
P | Uma das suas imagens de marca é o trabalho com a formação do Ajax, daí que se esperasse algum contributo nessa área, mas não se deu por isso. Estávamos distraídos?
R | Temos falado muito sobre a estrutura do FC Porto, sobretudo sobre o desenvolvimento dos jogadores, mas esta época focámo-nos na primeira equipa. Jan Olde Riekerink tem muita experiência nas escolas do Ajax.
P | Esperava-se que ele tivesse um papel nesse campo, mas não teve...
R | Talvez no futuro. Queremos ajudar o clube. Trabalhámos muitos anos na melhor escola do Mundo, que é a do Ajax, e temos muita experiência. Pode ser que na próxima época seja possível dar uma ajuda.
P | Tirando os minutos que o Hélder Barbosa jogou no Bessa, não usou ninguém das escolas. Porquê?
R | Porque já tenho muitos jogadores.
P | Vieirinha e Paulo Machado?
R | Do Vieirinha ouvi muitas coisas positivas. É um típico extremo-direito, muito rápido, muito criativo...
P | Vai ter uma oportunidade na equipa?
R | Não posso responder nesta altura. Depende dos movimentos no mercado de transferências. Por agora, não fizemos nada, mas às vezes, numa semana ou num dia, as coisas mudam.
13 - "Diego precisa de defender e de aprender a marcar golos"
P | Por que razão Diego não cabe no seu modelo táctico?
R | Diego é um jogador muito, muito bom, mas decidi jogar com dois pontas-de-lança para pressionar mais e desapareceu a posição dez. Quando jogo com número dez, depende do jogo e do tipo de dez necessário, se precisamos ou não que ele ataque e defenda, porque a transição é muito importante. O problema dele é que não marca golos. É mais de entregar a bola do que de procurar a baliza. Lisandro, por exemplo, é um dez que faz golos. Diego é um grande jogador, mas precisa de defender mais, precisa de aumentar o seu raio de acção, de correr maiores distâncias e precisa de aprender a marcar golos. Lembram-se de Litmanen, no Ajax? No princípio, também não marcava, era apenas um jogador de contacto, mas depois começou a marcar golos. Trabalhámos muito com Diego nesse aspecto, mas continua a precisar de melhorar. Talvez jogando no estrangeiro se torne melhor. No futebol alemão, é preciso correr muito. É necessário correr, atacar e fazer muitos quilómetros. No FC Porto, é mais fácil, porque já lá estamos, as distâncias não são assim tão grandes.
P | E Postiga? Como se passa dos elogios do treinador à equipa B?
R | Não foi um problema de qualidade, porque é um jogador de nível internacional e provou-o no Saint-Ettienne. Li que o treinador que saiu, Elie Baup, gostou muito dele. Mas Postiga pensa sempre que dá cem por cento nos treinos. Eu não concordo. Acho que uns dias dá cem, outros oitenta, setenta, sessenta. Tive muitos problemas para o convencer a trabalhar mais, para melhorar o seu nível. É difícil. Talvez seja o único treinador que teve problemas com ele, mas, se um jogador só trabalha uma hora e meia por dia, não pode dar menos de cem por cento. Ontem, visitei uma fábrica em que as mulheres trabalham das oito da manhã às seis da tarde, sem falar, sequer, umas com as outras. Todos os dias o mesmo. Se és um futebolista profissional e só tens de trabalhar uma hora e meia, tem de ser a cem por cento. Não aceito menos. Só se pode melhorar uma equipa ou um jogador dessa forma. Um dia não se está bem disposto, OK, mas isso é uma vez.
P | Nesse caso, o que aconteceu foi que perdeu a esperança?
R | Avisei-o uma, duas, três vezes e afastei-o. Se não, os outros jogadores, que ouviram, teriam legitimidade para pensar, 'se ele não dá cem por cento, por que hei-de eu fazê-lo?', e lá se ia a equipa. Essa é a razão de ter passado aos bês. Não é por ser mau jogador; é um óptimo jogador, mas tem de fazer o seu trabalho e, na minha opinião, não fez. Outros treinadores podem aceitar que ele trabalhe a sessenta ou setenta por cento, desde que marque golos; eu não, porque também trabalho sempre a cem por cento.
P | O problema com Jorge Costa era semelhante?
R | Não. Jorge Costa é cem por cento profissional, muito boa pessoa e um profissional sempre muito positivo. O problema está no sistema. É necessária muita velocidade. Ele pode defender muito, muito bem numa pequena área, com muitos jogadores à volta, mas não num grande espaço. É impossível para ele. Naquela idade, com a mobilidade, as lesões - li que esteve duas ou três vezes lesionado na Bélgica -, não dá. Numa zona pequena, jogando numa equipa defensiva com quatro jogadores e mais dois à frente, ele ainda é um central de top, mas neste sistema não. Constatei-o imediatamente, nas duas ou três primeiras semanas, e disse-lho. Ele quis ficar na mesma e eu autorizei-o a tentar provar-me que podia jogar, mas não o utilizei, porque não mudei de opinião. Tinha tomado a minha decisão e foi uma boa decisão para este sistema. No entanto, respeito o Jorge, porque foi sempre positivo para o grupo e trabalhou a cem por cento até ao último momento. É um verdadeiro profissional e um elemento muito bom para o FC Porto.
P | Sentiu a pressão dos adeptos?
R | Muito. Não fazia ideia de que ele era tão popular. As pessoas diziam-me 'sem o nosso capitão, não ganhamos nada', porque sempre tinham visto o seu clube vencer coisas com o Jorge Costa. Simbolizava o espírito de luta do FC Porto.
P | A decisão foi mais fácil por não saber disso?
R | Era melhor que soubesse. Havia sempre uma senhora de idade no aeroporto que me ameaçava por não usar o Jorge Costa. Agora usa uma camisola do Pedro Emanuel. Tenho de passar a ter cuidado com ele.
14- "Abertura com a Imprensa não funciona em Portugal"
P | O "blackout" foi imposto para proteger Adriaanse da Imprensa ou para proteger o FC Porto de Adriaanse?
R | Serviu para proteger o clube, proteger os jogadores e proteger-me a mim também.
P | É que a Imprensa não estava habituada a ter tantas revelações e notícias nas conferências de um treinador do FC Porto. Por exemplo, foi você quem revelou o ultimato feito ao Nuno Valente...
R | Pois, eu dei-vos a notícia. Na Holanda, temos um espírito muito aberto. Estou habituado a explicar tudo, porque sei que só assim consigo chegar aos adeptos. E eles têm de estar informados. Mas, se as notícias estão a funcionar contra o clube, contra os jogadores ou contra mim, não é bom. Nesse caso, sou castigado por ser aberto. Tive a sensação de que isso estava a suceder, daí a nossa decisão de fazer uma paragem.
P | O clube alguma vez lhe disse que estava a ser demasiado aberto nas conferências de Imprensa?
R | Não, eu tomo as minhas próprias decisões. No princípio, disse-lhes que era aberto e que a Imprensa tinha o direito de saber tudo, para poder explicar aos adeptos, de forma a que eles entendam melhor o FC Porto, os jogadores e a mim próprio, mas a verdade é que isso não funciona em Portugal. O JOGO quer ser melhor do que "A Bola" e "A Bola" quer ser melhor do que o "Record", portanto, também há competição nessa área. Às vezes, fazem notícia de algumas palavras e não é bom para nós. Por isso, passámos a ser mais reservados.
15 - "João Paulo vai fazer a pré-época"
P-Pediu Diogo Valente?
R- Não. Foi uma sugestão do departamento de prospecção e eu vi-o jogar pela Selecção e pelo Boavista. Tem um bom cruzamento, mas não fez muitos jogos pelo clube. Surpreende-me que não tenha feito.
P-É o tipo de extremo que quer?
R-Tem um cruzamento muito bom. Tivemos um exemplo no Portugal-Suíça, de Sub-21, quando ele pôs a bola no Hugo Almeida. Gostei bastante.
P-E João Paulo?
R-Vai fazer a pré-época connosco.Vi-o jogar, claro,mas não o conheço muito bem. Para o posto do Paulo Assunção, não temos muitos jogadores e ele pode jogar nesse lugar. Talvez também na posição do Pepe, mas preciso de ver, porque nenhuma equipa joga no nosso sistema. Só experimentando.
P-Ricardo Costa quer sair. Qual é a resposta que lhe dá?
R-Não quero. É um jogador muito bom. Pode jogar nas posições do Bosingwa, do Pepe, do Pedro Emanuel e talvez possa jogar também na do Paulo Assunção. É um novo lugar para ele, mas tem condições para aprender a jogar lá. Quero mantê-lo. E é um verdadeiro portista e um homem forte, de carácter forte. Precisamos de jogadores assim.
16 - "O FC Porto sabe escolher os reforços"
P-Há alguns anos, pessoas do FC Porto queixavam-se de um treinador que conhecia muito mal o mercado estrangeiro. O Co Adriaanse sente-se à vontade nessa área?
R-Sim. Temos uma relação boa e aberta com o departamento de prospecção, o Antero Henrique e o presidente para falarmos disso.
P-Tem a sua própria lista?
R- Claro. Não conheço o mercado do Brasil. Conheço um pouco o mercado português, que eles conhecem muito melhor do que eu. O FC Porto ganhou muitos títulos, por isso sabe escolher bons reforços. Deram-me os jogadores com que ganhei o campeonato e a Taça. Eles é que escolheram. Só escolhi um, o Fatih Sonkaya, e foi no último instante, quando se percebeu que o Kromkamp não vinha.
P-É importante que os reforços conheçam o campeonato português?
R-É uma vantagem que conheçam a língua, os estádios, os adversários...
P-Foi um dos motivos da contratação do Adriano?
R-Uma vantagem, sim, mas o mais importante é a qualidade dos jogadores. Não importa o país. Tem as qualidades necessárias para jogar numa posição dentro do nosso sistema? Isso é que interessa.
17 - "Liguei a Koeman lhe desejar sorte para no PSV"
P-Jogou nove vezes com Koeman e nunca ganhou. Como é possível?
R- É normal. As pessoas em Portugal não me conhecem porque não fui um jogador conhecido internacionalmente. Ninguém conhece o AZ, ou o Willem II, apenas o Ajax. E as pessoas dizem muitas vezes que nunca ganhei nada, mas a verdade é que ganhei tudo na Holanda, antes de vir para Portugal. Qualquer treinador que consegue resultados melhores do que o orçamento de que dispõe, e se as suas equipas jogam bem, também é um treinador campeão. Com o Den Haag, com o Willem II ou com o AZ não se pode ser campeão nacional. Nem o Mou-rinho, nem o Koeman, nem eu: ninguém. Portanto, não é justo dizer que não ganhei títulos. Ganhei alguma coisa em todas as equipas que treinei. Com o Zwolle, passei da segunda para a primeira divisão. Com o Den Haag, da segunda divisão para a primeira. Como treinador do Ajax, fui cinco vezes consecutivas campeão da Holanda com os juniores. No primeiro ano enquanto técnico principal do Ajax, fiz uma equipa inteiramente nova, fiquei em terceiro e fui àTaça UEFA, isto quando nos anos anteriores o Ajax tinha ficado em quarto e quinto. No segundo ano, estávamos em segundo a apenas um ponto do primeiro e despediram-me porque tinha problemas com a administração. Com o Willem II, fui à Taça UEFA depois de 32 anos sem competições europeias. No segundo ano, fomos à liga dos Campeões. São grandes objectivos para pequenas equipas. Por isso, quando se olha para o currículo de um treinador não se pode concluir que não ganhou nada só porque não tem títulos. Perdi oito vezes com Koeman? Sim, claro. Se ele treina o Ajax e eu o Willem 11 é natural que ganhe.
P-Também aconteceu consigo no Ajax e ele no Vitesse. Koeman sabe alguma coisa sobre si que usa e que nunca falha?
R- Acho que são mais os jornalistas que usam algumas coisas contra mim. Tenho uma excelente relação com o Koeman, que é um excelente treinador e uma pessoa fantástica. Aliás, liguei-lhe a desejar-lhe toda a sorte com o PSV Eindhoven.
P-Disse uma vez que era mais ofensivo e Koeman mais defensivo. Mantém essa posição?
R-Não sou só eu que o digo. Qualquer treinador, qualquer jogador ou jornalista holandês sabe que sou o treinador mais ofensivo da Holanda. Todos os outros treinadores têm filosofias muito mais defensivas. Hiddink, Koeman, todos têm uma postura mais defensiva. Sou o único que jogou um futebol de ataque com todas as suas equipas. Agora, como é óbvio, quando corremos riscos, acabamos por perder algumas vezes. É a natureza do jogo.
18 - "Temos de ser um exemplo de fairplay"
P-Durante uma boa parte da época, pareceu claro que os adeptos não estavam consigo. Acha que isso mudou definitivamente? Na próxima terá os adeptos pelo seu lado?
R-Nunca se sabe, mas conto com isso. Na próxima época, começamos com zero. Vamos esquecer os prémios. Temos de trabalhar duramente se queremos ser campeões outra vez. Queremos ganhar a Taça e queremos marcar mais golos. Pretendemos uma média de dois por jogo: em trinta jogos, sessenta golos nomínimo. Sofrer menos é difícil, porque 15 ou 16 é um número muito bom; portanto, é natural que na próxima época soframos mais. Também queremos menos cartões amarelos; na próxima época temos de ser os primeiros no ranking do fairplay: se temos a bola, se controlamos o jogo, não podemos levar cartões. Só se pode levar amarelo quando não se tem a bola e quando o nosso comportamento não é bom. Temos de ser um exemplo de fairplay. Profissionais, com certeza: o Paulo Assunção tem de fazer um tackle, tudo bem, é futebol, mas vi muitos cartões amarelos desnecessários. Liga dos Campeões: pretendemos uma performance melhor do que a da última época, claro. Depende, evidentemente, dos nossos adversários. Se tivermos o Barcelona no primeiro jogo, é difícil; se começarmos contra um clube pequeno, é mais fácil. Na Liga dos Campeões, também é necessária alguma sorte com os adversários, mas é óbvio que temos de fazer melhor. Seja como for, é difícil sermos campeões outra vez, ganhar a taça outra vez, fazer mais na "Champions" em ser outra vez o melhor treinador em Portugal. Mas temos de tentar.
P- Mencionou a importância que da à disciplina. Até que ponto lhe deu trabalho?
R- Não muito. Os jogadores foram disciplinados desde o início. Ouvi muitas histórias, mas nunca precisei de multar ninguém. Se um jogador se atrasa num treino, leva um amarelo; da segunda vez, fica obrigado a chegar uma hora mais cedo no dia a seguir; da terceira, uma semana completa. Acontece. Queixam-se do trânsito, muito bem, então devem sair mais cedo de casa. Eu também apanho trânsito. Mas acho que a disciplina foi boa. As regras são claras: chegar cedo, usar as caneleiras. Regras normais. Só pedimos o comportamento normal nurrtgrupo. Se o explicamos e o controlamos, não temos problemas:. Eu nunca tive problemas corpos-meus grupos na Holanda.
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